segunda-feira, 18 de novembro de 2019

O juridiquês escroto de Celso de Mello e Rosa Weber

J R Guzzo


O Artigo 13 da Constituição Federal diz que “a língua portuguesa é o idioma oficial da República Federativa do Brasil”. Mas quem ouve a ministra Rosa Weber ou o ministro Celso de Mello, por exemplo, lendo no plenário do Supremo Tribunal Federal a papelada em que escrevem as suas sentenças não consegue entender coisa nenhuma do que estão dizendo. É português, aquilo? As palavras estão no Aurélio, é verdade, mas alguma coisa está muito errada com todo o resto, pois o patuá com que se dirigem ao público é perfeitamente incompreensível.

Existem problemas óbvios com a sintaxe, a morfologia, a semântica, a análise lógica, a sequência compreensível de frases, a conclusão de raciocínios e tudo o mais o que compõe uma gramática correta - e o resultado é que ao invés de usar as palavras certas nos lugares certos, mandamento número 1 da linguagem bem falada ou escrita, usam as palavras erradas nos lugares errados.

Pode isso, Arnaldo? Não deveria poder, pois o cidadão brasileiro, pelo que diz a lei, tem o direito de ler ou ouvir em português todo e qualquer documento público. Com o idioma que usam, a ministra Weber ou o ministro Mello poderiam muito bem falar em húngaro nas sessões, por exemplo - iria dar na mesma, já que ninguém vai entender nada de um jeito ou de outro.

Esses dois são casos desesperados, mas a maioria dos outros ministros não é muito melhor - acham que estão falando em “linguagem técnica”, ou “erudita”, quando estão apenas escondendo a sua incapacidade de se expressar em português correto. É uma comprovação a mais do subdesenvolvimento deste País.

Imprensa inventa maioria de negros nas faculdades

Gabriel Wilhelms - O uso dos pardos como curingas em nosso baralho racial

Vemos nas manchetes que pela primeira vez na história os negros são maioria nas universidades públicas, representando um percentual de 50,3%. O número chama a atenção, então decido “cavar” mais um pouco, apenas para descobrir o que já sabia quando li as manchetes: o percentual de 50,3% é o somatório de pretos e pardos, que, por alguma razão, para o IBGE compõem a chamada população negra. O número está presente no estudo Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil do IBGE.

 A estatística induz ao erro, levando a crer que mais da metade das vagas são ocupadas por pretos, quando na verdade o são na maior parte por pardos. O mesmo acontece com a população brasileira, afinal, quantas vezes ouvimos por aí que mais da metade da população é formada por negros? A pegadinha é que a parcela realmente formada pelos que se declaram pretos é bem menos expressiva. Conforme dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua – PNAD Contínua de 2018, 43,1% se declaravam brancos, 46,5% pardos e somente 9,3% pretos; esses três grupos respondem por 99% da população brasileira, sendo o restante composto por outras etnias. O uso do termo “negro” para abarcar pretos e pardos pode parecer uma sutileza de menor importância, mas na verdade esse fato altera todas as conclusões que podem ser tiradas da estatística.

Como podemos notar, os pardos, que representam diferentes tipos de miscigenações – brancos com pretos, brancos com indígenas ou pretos com indígenas, entre outras – perfazem a maioria da população brasileira, revelando nada mais, nada menos do que a miscigenação histórica que atuou na formação da civilização brasileira. Portanto, as tentativas de traçar uma linha arbitrária entre pretos e brancos e de advogar o faturamento de pretensas dívidas históricas entre uns e outros encontram na própria “mistureba” do brasileiro um empecilho. É aí que entram os pardos, ora dando peso em números para alguns argumentos, ora para outros, servindo como verdadeiros curingas no baralho racial que é o brasil.

 Não que eu acuse o IBGE de fraudar as estatísticas, mas o instituto toma mão de uma definição que me parece bem infeliz e que abre margem para o uso manipulativo, servindo, intencionalmente ou não, como um aliado da desinformação, sobretudo porque, segundo o próprio enquadramento do IBGE, pretos e pardos são categorias distintas juntamente com brancos, amarelos e indígenas. Podemos notar que certos militantes, visando a exagerar e dramatizar seus argumentos, tendem a transformar os pardos em pretos em presídios – subsidiando narrativas como a do encarceramento em massa da população negra – e em brancos nas universidades – sugerindo que estes sejam ambientes de amostra da segregação racial. Ironicamente, o estudo do IBGE contrapõe o argumento. Aliás, o que o estudo revela é que, assim como uma parcela expressiva da população brasileira, os pardos também são significativos nas universidades

O estudo, como sugerido pelo nome visa a apontar “desigualdades” entre brancos e negros (pretos e pardos). O problema é que, se considerarmos que há mais pardos do que brancos, essas estatísticas não traçam um cenário realista da população brasileira. Poderíamos usar a estratégia do presídio e inverter a lógica, somando pardos com brancos, o que seria igualmente irrealista para os argumentos sustentados, já que a maioria da população continuaria sendo miscigenada.

Juntando as duas categorias como se fossem a mesma coisa, o estudo chega a conclusões como a de que a população de pessoas desocupadas é de 64,2% dos “negros” contra 34,2% de brancos, ou de que o rendimento médio real habitual de pessoas ocupadas é de R$3.282 para os brancos contra R$2.082 para os negros em ocupações formais, e de R$1.814 para os brancos contra R$1.050 para os negros em ocupações informais.

Alguém poderia arguir que, se ao invés de somados aos pretos, os pardos fossem somados aos brancos, alguns números poderiam ser ainda mais alarmantes em termos de “desigualdade” para a população de pretos, mas aí que está o X da questão, pois, como vimos, estes perfazem menos de 10% da população brasileira, o que obviamente explicaria menor peso percentual em universidades, por exemplo. Talvez por isso haja um fetiche tão grande em colocar os pardos na conta, pois se a “população negra” resultante é de mais da metade da população, então isso daria peso à estratégia de se cobrar a mesma fatia de presença e participação em diferentes contextos, o que se personifica muitas vezes em políticas públicas (feitas com dinheiro público), como no caso das cotas raciais.

Não vejo sentido em classificar os pardos como negros e vejo menos sentido ainda em usá-los para pintar um cenário de maior desigualdade racial quando estes são justamente os que melhor demonstram a miscigenação do povo brasileiro, a mistura de cores e etnias que é obstáculo para as tentativas de polarizar negros (pretos) e brancos, sobretudo quando políticas públicas serão paridas a partir daí.

domingo, 17 de novembro de 2019

Lula saiu da prisão, na melhor das hipóteses, igual ao que era quando entrou

José Roberto Guzzo, O Estado de S.Paulo

O ex-presidente Lula acaba de completar uma semana do lado de fora da cela sala-e-quarto onde passou o último ano e meio, mas não foi preciso mais do que uma ou duas horas para ficar claro que ele saiu de lá, na melhor das hipóteses, igual ao que era quando entrou. Talvez já tenha passado da idade para fazer mudanças. Talvez não consiga ser diferente da pessoa que se tornou desde que sua vida política foi à falência – ou, como se diz hoje, entrou em recuperação judicial. Talvez tenha uma incapacidade clínica de perceber que pode cometer algum erro. Acha que está sempre ganhando, mesmo quando o placar mostra 4 a 0 para o adversário – e quando a coisa fica assim nada tem conserto. O fato é que Lula não foi capaz, depois de solto, de fazer um único gesto de paz. Como antes de ser preso, quando ameaçava por “o exército do Stédile na rua”, só conseguiu apresentar uma proposta: “Vamos para a briga”.

Os especialistas em analisar Lula e concluir que ele sempre tem alguma estratégia genial na cabeça, tão genial que está necessariamente acima do entendimento comum, sugerem que o homem, mais uma vez, está dando uma aula de política para o Brasil. Que aula seria essa? Como no “Plano de Deus”, que o catecismo nos diz que é misterioso por natureza, e por isso dispensa explicações lógicas, o Plano de Lula nos será, talvez, revelado um dia. Por enquanto o que temos é o que ele diz em público. Uma de suas primeiras sugestões foi transformar o Brasil “num Chile”, onde milícias do mesmo tipo que as suas querem obter o socialismo instantâneo tocando fogo no metrô. Outra foi disputar com o ministro Sérgio Moro, mano a mano, um pega de MMA para ver do lado de quem o povo brasileiro está. Declarou uma guerra de destruição contra o governo eleito do presidente Jair Bolsonaro. O pensador-chefe de seu partido disse que “a luta”, agora, não é mais para tirar Lula da cadeia, mas para “retomarmos o governo” – ou o poder, que, segundo o mesmo pensador, é uma coisa “muito diferente do que ganhar eleições”. O que significa um negócio desses? Deve fazer parte, talvez, do “Plano de Deus” – de modo que não adianta ficar perguntando muito.

O que se pode dizer, com certeza, é que nada disso combina com a vida real. Lula continua inelegível e condenado, por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, em três instâncias. Não foi absolvido de nada – ao contrário, já está condenado num segundo processo criminal e tem mais uma meia dúzia de sentenças ainda a receber, das quais poderá apelar em liberdade por graça do STF. Bolsonaro e Moro, com quem ele quer brigar diretamente, são as figuras políticas mais populares do Brasil. Para destruir o presente governo Lula precisa combinar com os resultados concretos da economia, que estão fora de seu controle; não é fazendo “greve geral” e queimando pneu na rua que vai alterar o PIB, a inflação ou a taxa de juros. A oposição que ele diz comandar não tem 20% dos votos da Câmara e menos ainda que isso no Senado; na última vez que foi brigar, na reforma da Previdência, o governo ganhou com uma maioria de três quartos. Não pode nomear um porteiro de repartição. Terá de vencer eleições já no ano que vem, para as prefeituras, e em 2022. As Forças Armadas não estão a seu serviço, como acontece na Venezuela, para virar a mesa.


O fato é que Lula joga tudo, mais uma vez, no “nós contra eles”. O problema, nessas coisas, é saber direito quantos são os “nós” e quantos são os “eles”. São pequenos detalhes assim que criam as grandes dores de cabeça dessa vida. Os piores desastres, como se sabe, são causados por aquilo que não aprendemos.