Renato Souza - Correio Braziliense
A decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF),
ministro Dias Toffoli, que determina a suspensão de investigações que utilizem
dados do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), da Receita
Federal e do Banco Central, atinge em cheio o combate ao crime ao provocar a
paralisação nas ações dos órgãos de investigação criminal.
Entre 2014 e 2019, o Coaf produziu mais de 15 mil relatórios
indicando ações suspeitas de tráfico de drogas, atividades de facções
criminosas e corrupção. Esses dados, que estão apontados em um levantamento
divulgado pelo órgão, foram enviados às autoridades e são usados em diligências
em todo o país.
CAÇA À CORRUPÇÃO – De acordo com os dados do Coaf, foram
feitos, no período, 9.421 registros relacionados à eventual prática de
corrupção. Outras 1.586 informações estão ligadas à atuação de facções
criminosas e 4.391, a tráfico, totalizando 15.398 notificações. As informações
foram enviadas ao Ministério Público, à Polícia Federal e à Polícia Civil nos
estados. Como os chamados Relatórios de Inteligência Financeira (RFIs)
apresentam apenas detalhes iniciais, é necessário realizar investigações para
atestar ou não o cometimento de crimes.
Até a decisão do ministro, esse intercâmbio de informações
era realizado — como ocorre nos Estados Unidos e em países da Europa — sem
burocracia e não havia a necessidade de autorização do Poder Judiciário.
No entanto, após a liminar emitida pelo ministro na última
quarta-feira, as diligências em andamento foram paralisadas e novos relatórios
também ficam bloqueados para envio aos investigadores, até que se obtenha aval
da Justiça.
MOROSIDADE – O repasse das informações exigido por Toffoli
vai esbarrar na lentidão da Justiça e na morosidade dos tribunais, que já estão
abarrotados de processos. A suspensão vai vigorar, pelo menos, até que o
plenário do Supremo se reúna para decidir qual o nível permitido de troca de
informações entre agentes de controle do sistema financeiro e o Ministério
Público. O julgamento no plenário de um recurso que trata do tema está previsto
para novembro deste ano, e Toffoli já anuncia a intenção de adiantar o debate.
A Polícia Federal e o Ministério Público já paralisaram o
andamento de milhares de casos. A procuradora-geral da República, Raquel Dodge,
avalia se vai ou não questionar a decisão individual de Toffoli. Mas, entre
delegados da PF e procuradores, o clima é de perda na luta contra o crime
organizado.
ALEGAÇÃO – O presidente do Supremo diz atuar na “defesa do
cidadão”. Ele alega que está impedindo que informações privadas sejam
utilizadas de maneira inadequada. “Se não é feito dessa forma, se o
detalhamento é feito sem a participação do Judiciário, qualquer cidadão
brasileiro está sujeito a um vasculhamento na sua intimidade”, disse.
Professor de direito da Faculdade Presbiteriana Mackenzie,
Edson Luz Knippel destaca que existem outros meios de monitorar ações
criminosas ou suspeitas até que o Supremo decida sobre o assunto. “Os órgãos de
controle financeiro podem solicitar autorização judicial para acessar dados
aprofundados. No entanto, existem outros meios, como as denúncias recebidas
pela Polícia Federal, a percepção de indícios de evolução patrimonial e até
mesmo uma ação penal antecedente”, destacou.
ATÉ TERRORISMO – Além dos dados já mencionados, desde 2014,
o Coaf identificou diversas práticas suspeitas de crimes graves. Ao longo dos
últimos cinco anos, o Conselho enviou às autoridades 36 relatórios que apontam
eventuais crimes ligados à prática de terrorismo. Outros 42 dados revelam
movimentações suspeitas de estarem ligadas ao tráfico de pessoas.
A decisão do ministro Toffoli diz respeito ao
compartilhamento das informações. Mas não interfere na coleta e no
armazenamento dos dados. Ou seja, o Coaf continua monitorando todas essas
atividades, mas só envia as informações ao Ministério Público e aos órgãos
policiais se houver autorização da Justiça. Entre as competências previstas ao
Coaf, não está a de acionar o Poder Judiciário para informar sobre indícios de
crimes, o que limita uma atuação jurídica do conselho.

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